Conto de Carnaval


 


        Quinta-feira à noite, o calor estava beirando o insuportável, na TV mulheres seminuas se rebolavam em frenesi, Alzira, minha mulher, olhou-as com desdém e comentou,

     --  São umas vadias turbinadas de silicone. De vez em quando morre uma no bisturi, bem feito.

                                                                                   - 0 –

 

            Alzira, apesar dos 37 anos, fisicamente, ainda é uma mulher bonita. Conheci-a no curso de Arquitetura, eu estava me formando e ela era caloura. Nos conhecemos em um bar perto da faculdade. Muito bonita: pele morena da cor de chocolate, olhos amendoados, corpo tipo mignon e um belo sorriso. Sempre dei preferência às mulatas gordinhas. Ela destacava-se pela desenvoltura, tinha aquele brilho no olhar de quem é feliz. Sorria sem esforço das coisas mais bobas e era um sorriso autêntico, -- nada me mostra mais a personalidade de uma pessoa que o sorriso. Tenho verdadeiro asco de quem posta, no rosto, aquele sorriso de atriz. -- Gasparzinho foi quem me convidou para sentar-me à mesa com ela, era amigo de infância, um branco forte, dançarino e mestre capoeirista. Aquela seria a última vez que o via. Poucos meses depois soube que brigara num bar em defesa da namorada dele. Deu azar. O ex-namorado da moça era um policial, da civil, que não aceitando o rompimento do relacionamento entrou no bar para agredi-la. Gasparzinho reagiu, bateu no cara. O assassino foi embora, covarde, retornou com mais dois outros e o matou a sangue frio. Da namorada dele nada sei. O policial respondeu processo, porém soube que está solto e continua na ativa. Segundo jornal publicou na época, o policial alegou legítima defesa. Coisa da Justiça, esses caras, mesmo são, são mesmo inimputáveis. Vimos-nos, eu e Alzira, pela segunda vez no enterro de Gasparzinho. Conversamos e a convidei para irmos a outro lugar após o enterro no Cemitério Quinta dos Lázaros. Era autentica a dor que Alzira sentia e me comovi por ela. Não demorou muito e começamos a namorar. Ela morava num conjunto residencial de classe média baixa, no IAPI. O pai falecera quando ainda era criança. A mãe vendia marmitas para sustentar os três filhos. O mais velho, Belarmindo, já trabalhava quando a conheci. Era motorista de praça, dirigia um fuscão branco com ponto na porta do supermercado Paes Mendonça, o de Brotas, próximo a Cruz da Redenção. Hoje mora em São Paulo, é casado e, soube que alcoólatra, vive da pensão que Alzira envia mensalmente. O caçula, Adrobaldo, um viciado em cocaína, também vive as minhas custas. Um malandro de marca maior que nunca bateu um prego numa barra de sabão. Mulato claro, bem afeiçoado, bom falante, não vale a bosta que caga. Convence Alzira do que quer e quando quer. Ainda mora com a mãe que, pouco depois do casamento, alegando artrite, parou de trabalhar e é outro encosto. Nunca liguei para dinheiro, não que tenha vindo de família rica. Meu pai era um batalhador que, aos poucos, montou uma loja de materiais de construção. Trabalhei com ele desde meus treze anos, muito do que sei aprendi atrás do balcão vendendo ferragens, cimento, tijolos e arenoso. Minha mãe é professora aposentada. Hoje papai está bem de vida com sua loja de materiais de construção e sua madeireira que meu irmão, Eduardo, administra com muita competência. Alzira, após o casamento, largou a faculdade. Alegou ser para cuidar de mim. Hoje descubro que Alzira se casou comigo foi para cuidar da família da mãe dela as minhas custas. Se conto a vocês isso é para quando me julgar, vocês terem uma visões clara e saber como as coisas aconteceram de maneira verdadeira, e não me condenar pela história contada nas redes sociais. Já ia me esquecendo de falar de mim. Sou arquitelo pós-graduado em designer de ambiente. Também sou mulato claro, tenho 42 anos e sou proprietário de uma empresa próspera. Tenho duas lojas que vendem cozinhas de alto padrão, feitas sob medida e projetadas por mim e por mais dois arquitetos, nossos produtos são dirigidos a classe A. Além das cozinhas, atendemos a estaleiros que produzem Yates e Lanchas de alto luxo. Projetamos e construímos os ambientes mais sofisticados que vocês possam imaginar.

            Até o ocorrido trabalhava mais de 12 horas por dia. Não tenho filhos, não que eu tenha escolhido não tê-los, mas minha mulher nega-se a “estragar seu corpo para parir e depois ser abandonada numa clinica de repouso pelos filhos”. Tentei convencê-la a adotarmos uma criança, mas ela se nega também. “Quem pariu Mateus que balance.” --  Veja como tudo aconteceu:                          

                O sono já me convidava à cama, entrei no banheiro escovei os dentes e de lá ouvi mais uma recomendação da patroa,

                -- Se for tomar banho não molhe o cabelo. Eu coloquei o ar-condicionado no máximo.

            Entrei no boxe e, respeitando a sugestão, fui ao banho sem lavar o cabelo. Vesti a cueca tipo boxe e, por sobre, o pijama azul de listas brancas, feito de cetim, que ganhei no Natal, junto a um ridículo par de pantufas a imitar coelhos mortos. Queria conhecer o desenhista que criou aquele aparato de calçar velhos. Sim. É assim que meu cunhado, Adrobaldo, aquele arruela-de-encosto, me chama: velho! Velho é meu escroto que já nasceu enrugado, -- pensei. Deitei-me  na cama e liguei a TV do quarto. Rodei pelas centenas de canais disponíveis e entre enlatados americanos de enredo pífio e alguns filmes da Marvel repetido, eu não encontrei nada que prestasse. Senti vontade de ligar o notebook para ler as resenhas de cinema um amigo virtual ou ler as postagens a respeito do carnaval escritas por Renato Pinheiro. A vontade de ir ao facebook  passou assim que vi uma mulata sambando com seus balangandans, estava deslumbrante na TV, lembrava-me as mulheres que vi junto a meu pai no Rio de Janeiro em um show de Sargentelli. Dançando daquele jeito, parecia que há qualquer momento ela pularia para minha cama. – Me toquei – sim. Ali mesmo onde você imaginou. Mas minha mulher entrou no quarto e de modo a disfarçar ajeitei a cueca por baixo do pijama. Após me tomar o controle do televisor ela o desligou, colocou o controle remoto sobre o criado-mudo e se deitou a meu lado. Busquei me ajeitar ao corpo dela com segundas intenções. Com o cotovelo a cutucar minhas costelas e com uma voz irritante a ouvi resmungar,

                -- Vê umas nigrinhas na televisão e quer se aliviar em mim, estou com enxaqueca”.

            Perdi o tesão. Ela tem esta capacidade de me esfriar. Na tentativa de fugir daquele tédio que minha vida se encontrava, eu perguntei:

            -- Vamos dá um pulo amanhã na Barra? Consigo com Jorge as camisas e o camarote é all inclusive, alugo uma vã com motorista para não ter problemas com o carro...

                Ela me interrompeu.

              -- Que é que um velho como você quer no carnaval? Tome vergonha na cara, homem, se ponha em seu lugar! – e friamente completou – Vê se eu vou deixar o meu sossego para me misturar com um bocado de negão suado e fedorento.  Me deixe dormir, vai!

            Virei de costas para ela e fiquei tentando me lembrar do que me fez escolhê-la como esposa ou mesmo o porquê de ter me casado. Quando me casei, ainda não era rico, mas estava bem de vida. Se imaginasse que aquela menina alegre de olhos amendoados se transformaria em meu carma de forma tão hitleriana, eu não teria me casado. Ainda mais agora que sei que não casamos com a mulher, casamos com a família dela e agregados. Suportá-la já me é difícil, mas quando se junta com as amigas ou a mãe fica ainda mais insuportável.

          Acordei tarde no outro dia, quase na hora do almoço.  Dormira mal, o condicionador de ar esfriara demais e não consegui localizar o controle do aparelho para desligá-lo. Minha patroa, devidamente enrolada no edredom, resmungava a cada tentativa que fazia para cobrir-me. A solução foi por a camisa do pijama e cruzar os braços.

           Após escovar os dentes, ainda de pijamas, procurei por meu cigarro. Tinha certeza de ter comprado um pacote de CHARM, mas não o encontrei no armário e tinha plena convicção que lá o guardara junto a minha carteira que também sumira. Deduzi de imediato que o filho-da-mãe do meu cunhado estava metido na história, parti em direção à sala enraivecido e lá tive a certeza. Alzira havia dado o pacote de Charme ao irmão caçula, e ainda se deu ao desplante de me dizer que Charm era cigarro de viado e que ela não iria mais me suportar fumante. Contei até dez. Se desse vazão a minha vontade a esmurraria ali mesmo. Não disse nada, engoli a seco um Losartana de 100 mg, bebi um copo de leite, ainda de pé, e retornei ao quarto. Pretendia me vestir para ir comprar cigarros quando ela entrou para perguntar aonde eu iria. Respondi. “Vou comprar cigarros”, ela perguntou se eu precisava me vestir para ir até a esquina. Não discuti. Calcei o tênis, segurei as pantufas na mão e disse:

            -- Viado é seu irmão que comprou essa merda, com meu dinheiro. Sei que você deu a ele o dinheiro para ele comprar os presentes de Natal para mim. E ele comprou este pijama de supermercado e estas pantufas  só para me sacanear. Diga àquele imprestável que dê um jeito na vida dele. Cansei de sustentar vagabundo...

            Alzira desandou a falar e eu terminei por me arrepender pelo desabafo, tive que ouvir o blá, blá, blá incessante dela enquanto procurava por minha carteira e as chaves do carro que também desaparecera. Encontrei a carteira após vasculhar quase toda a casa, sobre a geladeira da cozinha. Contei o dinheiro e dei falta de trezentos reais. Mesmo medicado minha pressão subiu. Olhei pela janela em busca do carro, ela o havia emprestado a Adrobaldo. Respirei fundo e disse, então vou andando e entrei no elevador. Ao sair, na portaria, Almir, o porteiro, não perdeu a oportunidade de me gozar.

            -- Já vai para a farra, Seu Zé. Gostei da fantasia.

          Eu dei um sorriso de sardônico, não quis transferir a ele meu mal humor. Almir é um bom garoto. Trabalha com zelo e estuda à noite. No momento cursa Faculdade de Direito financiada pelo Governo Federal. É bom ver que pelo menos uma pequena parte de nossos impostos estão sendo bem utilizados.  Desci as escadas que dá acesso a Rua Bahia, na Pituba, e caminhei em direção à barraca de Amigão. A barraca estava fechada. Outra só nas imediações do HSBC, na Avenida Manoel Dias da Silva, uma boa caminhada, ainda mais para quem está de tênis e pijama de cetim. Enquanto andava os transeuntes me olhavam disfarçando o riso, mas é carnaval, e em sendo, quase tudo é perdoável nesta calorenta sexta-feira. Alguns jovens passaram por mim ressaqueados, outros ainda bêbados, um deles levantou o polegar e gritou:

            -- É isso, Coroa. Tá cheio de “mulé” dando fácil, aproveita que tá vestido de vou prá cama e leva uma piriguete prá escorregar no tobogã.  

             Eu dei sinal de positivo e continuei andando. O Sol me fazia transpirar, a boca secou, mas insisti e continuei. Demorou, mas cheguei à banca de revistas ao lado da agência do HSBC. De lá notei a fila em frente ao banco Bradesco 24 horas. Comprei uma água mineral e o cigarro, não tinha o Charm e me contentei com o Free, comprei logo 4 maços e enchi os bolsos do pijama. Mesmo arfando pela caminhada, tratei de acender um cigarro para matar a ansiedade. Pensei em comprar o jornal, um velho hábito que há alguns anos eu perdi, leio-os pela internet, dou-me ao luxo de ler os da terra e alguns do exterior, The New York Times e The Washington Post, americanos, e o francês Le monde. Preferi não gastar o troco antes de consegui sacar mais algum dinheiro. Caminhei para fila do banco e todos me olharam. Me senti estranho de pijama e tênis, uma senhora baixinha e arredondada, de cabelos brancos, que estava em minha frente, volveu-se e me perguntou:

                -- “É do bloco do chiclete? Meu filho vai sair lá!

            -- Não, senhora. Sou do bloco dos coroas “Bananas de Pijama”.— e repeti o chiste do transeunte. A fantasia é “Vou pra cama”.

                Ela sorriu e disse:

            -- Hoje tá uma putaria danada no canaval. Ninguém mais se respeita. Em meu tempo não era assim não. A gente se fantasiava e saia com as amigas para desfilar na Rua Chile. Tinhas os caretas, as serpentinas e os confetes tinha até as lanças perfume. Tinha os bêbados sim, mas era tudo com muito respeito. Hoje valha-me Deus... é uma perdição que dá dó.

             -- Mas no nosso bloco só sai coroas, todos homens honestos e pais de família. – Menti buscando preservar o pouco de dignidade que me sobrara.

                Ela disse para puxar assunto – Sei. Um bloco de molecagem do tipo As Muquiranas, meu filho sai lá também. Um bocado de marmanjo vestido de mulher... O mundo tá perdido...

                 Iria perguntar a idade do filho dela.  Resolvi não fazê-lo porque minha vez estava por chegar. Na máquina fiz um saque de trezentos reais, conferi para ver se meus cartões de crédito estavam na carteira, caso algum não estivesse bloquearia e daria queixa na polícia, estava resolvido a não me deixar mais ser roubado por quem quer que fosse. Mas estavam todos lá. Caminhei em direção a orla pagar um taxi. Ao passar pelo Qui Moqueca, na esquina da Rua Paraíba com Avenida Otávio Mangabeira, resolvi almoçar por lá mesmo. Já fazia um tempo que não comia uma moqueca de peixe ao molho de camarão ou mesmo bebia um shop bem tirado. Entrei, coferi se ainda aceitavam meu cartão internacional do American Express. Sim, ainda aceitavam, me sentei e pedi um shop e a moqueca. Queria conter à revolta antes de retornar para casa. De repente uma trupe entrou no restaurante, quatro mulheres e um rapaz, e todas muito bonitas, uma delas uma loira belíssima que, vez por outra, estancava o olhar em mim. Já havia me esquecido que trajava o pijama e o tênis. E numa dessas olhadas a convidei para vir a minha mesa. Ela balançou a cabeça negativamente e com o dedo indicador me convidou a ir à mesa onde se reunia com as outras e o rapaz. Pensei, não tenho nada a perder e fui até à mesa onde estavam. A loira puxou uma cadeira vazia para eu me sentar ao lado dela e eu sentei. Ela disse:
            -- Gostei da fantasia, muito original. Vocês baianos são muito criativos.  
            -- Obrigado. – Mantive a mentira na maior cara de pau.
            Outra, uma morena igualmente bonita me perguntou.   
            -- Com esse calor não seria mais fresco usar um pijama tipo bermuda e a camisa de mangas curta?
          -- A princípio sim -- respondi – Mas se você considerar o sol na pele, eu ficaria ardendo, é melhor assim, além do mais durante a noite sentiria frio.
            -- Não havia pensado nisso – ela falou sorrindo e completou – não está cedo para pular carnaval.
Gosto de ir cedo e ficar logo no camarote. Aproveito e ajudo na organização. -- Lá terei que tirar a parte de cima do pijama e vestir a camisa do camarote. Se sentir fio uso a camisa do pijama como agasalho.  
            -- Você trabalha num camarote? -- A morena insistia no interrogatório. Respondi,
            -- Não. Tenho um amigo que é o dono de um camarote na Barra, amigo irmão, e como arquiteto eu assinei o projeto. Há anos prometo ir, mas nunca fui. Minha ex-mulher não gosta de carnaval.
            -- Anrã! E hoje ela deixou você ir? – Insistiu a morena nas perguntas.  
            -- Não foi bem assim... hoje eu que resolvi me deixar ir... Cheguei ao meu limite. Estou de saco cheio de meu casamento...
             A loira me dizendo que eu não devia explicação, falou,
        -- Ele “rodou-a-baiana”. – e o que você tem com isso, mulher. — dirigindo-se a morena que se calou.
            Eu tentei amenizar o assunto respondendo a pergunta.    
        -- Para dizer a verdade sim... eu rodei-a -baiana, mas vamos mudar o assunto... e vocês? – perguntava, mas fui interrompido pela loira,

            A loura, segurando minha mão, disse,

            -- Não ligue não. Ela é enxerida, mas é gente boa.

            Respondi me explicando:

        -- Me perdoe. Como fui indelicada. Deixe-me apresentar. Elias, nosso produtor, Ana Clara (Morena), Sandra, Mayara (mulatas) e eu, Adelaide,(a loira) somos dançarinas. E você, como se chama?

            -- José Ricardo, mas pode me chamar de Zé.

            -- Prefiro chamá-lo de Rick , se importa? Perguntou Ana Clara.

            -- Não. Por que me importaria? – respondi.  

           O garçom chegou à mesa onde eu estava com o shop. Eu acenei e pedi que trouxesse o shop para mim. Elias disse estar morrendo de fome e me pediu que sugerisse algo. Sugeri o que eu já havia pedido, moqueca de peixe ao molho de camarão, e disse -- basta pedi mais um prato que dará para saciar a fome de todos, e completei –  eu como muito pouco e as porções aqui dão para dois tranquilamente. Ana Clara, disse ser alérgica a camarão, sugeri um peixe frito. Ela topou. Perguntei as meninas o que beberiam. Ficaram no refrigerante. Ana Clara, a mais desenvolta, contou-me que vieram para almoçar e depois voltariam ao hotel para descansar. Mayara, uma das mulatas envolvendo-se na conversa, disse, completando a explicação de Ana Clara, que elas dançaram a noite toda em um trio elétrico, que vieram a trabalho e, no sábado, retornarão ao Rio para desfilarem, na segunda-feira, na escola de samba Unidos de vila Isabel e gritando, as mulheres, em coro, predisseram: “a Campeã do carnaval Carioca” e aplaudiram a si próprias.

            -- Até lá tem muito tempo, -- eu disse, após o susto, e completei -- eu convido a todos para irem comigo ficar ao camarote após o almoço. O camarote só abre mesmo à noite, mas para mim está sempre aberto. Ficaremos aqui bebendo até às cinco horas mais ou menos, depois iremos. Vou telefonar para amigo e alugarei uma vã para nos levar e nos trazer. E fiquem tranquilos que hoje é tudo por minha conta. Podem comer e beber à vontade.

          -- Não é preciso, Rick, -- disse Adelaide -- todas nós trabalhamos. Nós agradecemos a gentileza... Mas já está tudo pago.

            -- Fiquei triste! – falei para fazer charme.

            Elias, de modo sério, discursou:

            -- Todas vocês são livres, a escolha é de vocês, vocês fizeram ontem um ótimo trabalho, estão de parabéns. Como combinado, o hotel será pago amanhã às 10:00 horas e a vã as levará ao aeroporto para pegarem o voo das 13:00 horas. Se reportando a mim Elias disse, agradeço a gentileza, Zé Ricardo. As refeições e bebidas não alcoólicas estão por conta do contratante, ou seja, meu patrão. Estou com carro para levá-las, após o almoço, ao hotel. Se elas quiserem ir com você não há nada de errado, é só pegá-las lá. Eu, apesar da vontade de aceitar seu convite, estou trabalhando e não posso beber, fica para uma próxima oportunidade.

            Continuamos coversando até o termino do almoço. As meninas, após consultarem Elias, me convidaram para ir ao hotel com elas e eu aceitei. Já me sentia tranquilo e querido como há muito tempo não me sentia. No carro de Elias me colocaram no banco da frente e rindo as meninas jogaram Sandra, a menor delas, uma mulata belíssima, para vir em meu colo. Notei que de todas Sandra era a mais tímida.

            Não demorou e estávamos na porta do Hotel Alah Mar, bem próximo à praia do mesmo nome. No hotel as meninas subiram ao quarto e eu me dirigi ao bar e pedi uma dose de Black Label. Enquanto bebericava a dose e comia castanhas de caju salgadas, desrespeitando ordens médicas, Sandra apareceu para me fazer companhia. Ela estava uma delícia, com um micro short jeans e uma camiseta fina, curtíssima, e sem sutiã. Enquanto, disfarçadamente, eu não conseguia tirar os olhos dos belos seios dela, Ela contou-me que as outras meninas haviam decidido ir junto a mim para o camarote, antes, porém, dormiriam um pouco. Ela me faria companhia enquanto eu as aguardasse e que depois ela iria dormir. Perguntei se ela não queria vir também e pedi um drink para ela. Ela aceitou hi fi, e pude ver em seus olhos muita tristeza e perguntei, ousadamente, se ela não queria me contar o que a afligia. Ela desdisse do problema, mas após alguns drinks, resolveu se abrir. Contou-me que fora traída pelo marido, hoje falecido num assalto no Rio de janeiro. Mas que isso ela já havia, se é que possível ser superado. Fiquei aflito, queria ajudá-la, mas ele disse.

            -- Rick, você me parece um cara legal. Apesar de não estar sendo um cara legal com sua mulher agora. Ela deve estar preocupada... Tenho certeza que você retornará para casa assim que se acalmar. No entanto, meu caso é muito complicado. Você me vê assim e faz um julgamento errado a meu respeito.  Sempre fui uma pessoa muito introvertida, muito na minha mesmo, um bicho do mato como dizia minha mãe. Por ser assim meu circulo de amizade é bem restrito, bem restrito mesmo, hoje quase zero, restringe-se a minhas colegas de trabalho. Já faz alguns anos que meu marido morreu e a única coisa de bom que restou de meu casamento foi minha filha. Foi por insistência dela que eu resolvi fazer um perfil no Quepasa. Hoje MeetMe. Em 2010 entrei no Quepasa, coloquei no meu perfil que meu interesse era apenas amizade. Aos poucos, fui aceitando umas solicitações de amizade, mesmo assim, escolhendo pessoas de locais mais distantes, exatamente para me preservar de constrangimentos. Até que no final de 2010, aceitei a amizade de um rapaz de Portugal. Conversávamos, a principio via e-mail ou Quepasa, até ele me convencer a criar um perfil no MSN. Fiz o que ele pediu, e ao ver a foto dele no MSN, parecia que eu já o conhecia de longas datas e aos poucos fui abrindo meu coração, como estou abrindo aqui agora com você. Isso foi em julho de 2012. Em setembro de 2012 ele resolveu vir ao Rio. Passamos uma semana juntos e felizes, realmente tive a impressão de que já nos conhecíamos de longa data... fomos envolvidos por uma emoção e um encantamento que fez com que ele me olhasse e dissesse:isto é um encontro de almas!Tive que concordar com ele, não tinha outra explicação...

            -- Já entendi, Sandra. – Interrompi Sandra tentando finalizar aquela novela romanesca -- Você caiu na mão de sedutor mau-caráter...

            Ela, com olhos lacrimejantes, me pediu para terminar a história. Eu calei-me e fingi demonstrar interesse, mas completamente alucinado por poder ver por entre o decote o seio nu. Ela continuou a narrativa.

           -- Pois bem, logo no início da nossa primeira conversa, ele me contou ter tido um relacionamento que não dera certo e que não havia dado certo porque a mulher era muito estressada e possessiva, mas que apesar de estarem separados dedes 2009 eles continuaram amigos. Após esta semana ele retornou a Portugal. Não sei o porque recebi desta mulher um pedido de amizade no MSN e, ingenuamente, aceitei. Pouco depois de ele regressar a Portugal, num domingo, ela me chamou no MSN prá saber se eu havia recebido um Português no Brasil, disse a ela que não. Mas passei a conversa prá ele e pensei que tudo ficara esclarecido.

            Emocionada, Sandra pousou a cabeça a sobre braço e chorou. Puxei minha cadeira para junto a ela, o garçom se aproximou para perguntar se estava tudo bem. Disse que sim e completei, coisas do amor, mas vai ficar tudo bem. Me traga outra dose de uísque e um Ice, ela preferiu um gim tônica. Eu disse então um Gim-tônica e outro Black Label. O garçom saiu para apanhar as bebidas e eu a abracei alisando-lhe as costas. Ela levantou a cabeça, continuei a abraçá-la, ela não reagiu contrariamente e comecei a fazer cafuné em seu cabelo, senti que ela contraiu o pescoço, mas demonstrou gostar. Limpando os olhos com o antebraço, ela continuou a contar seu infortúnio,

            -- Pois bem... Como passamos a nos corresponder diariamente pelo MSN eu já tinha esquecido que deixara aberto meu Quepasa. Então resolvi deletar meu perfil de lá. Estava completamente envolvida com ele. Porém, ao entrar no Quepasa, notei que tinha vários pedidos de amizade de uma mesma pessoa da mesma cidade onde ele morava e, curiosa, resolvi aceitar. Era um rapaz que se dizia ser amigo dele e eu terminei por aceitá-lo. Eu jamais imaginaria que esse rapaz era um hacker e amigo da ex-namorada dele. Esse cara me enviava varias propostas. Queria porque queria vir ao Rio para me conhecer. Eu disse que não varias vezes. O que eu não sabia é que minha filha tinha feito há muito tempo atrás outro perfil meu no MSN e bem antes de eu tê-lo conhecido. Neste perfil que minha filha havia criado, ela postara que eu era solteira e que estava disponível para namoro e postou uma foto minha de biquine na praia de Copacabana. Agora veja Rick o que aconteceu. Este amigo da ex-namorada dele colocou um vírus em meu computador, copiou algumas conversas de minha filha com o namorado e colocou no MSN como se eu tivesse feito. Depois, por pura maldade, mostrou a ele esse perfil e ainda disse que eu tinha aceitado de ele vir ao Rio me conhecer... Alguns dias depois recebi um recado de alguém da família dele culpando-me por ele ter tido o colapso, me disseram que ele havia ficado muito nervoso com o que leu, desmaiou e foi levado as pressas para uma clínica, num pré-coma. Dizia também que a filha foi chamada e quando lá chegou, dois dias depois, ninguém da família foi reconhecido. Até mesmo a filha ele não reconheceu.  Ele agora passa por um tratamento Psiquiátrico. Passei a me corresponder com uma filha dele diariamente. Esta semana recebi um chamado dela dizendo que ele foi pego em atitude suspeita com uma corda na mão, perguntado, não soube dizer para o que era. Nós tínhamos um convívio diário mesmo com um oceano entre nós. Ficávamos horas na web, mensagens via celular, ele me ligava 2,3 vezes ao dia, ligava toda noite antes de dormir... esse silêncio agora é enlouquecedor. Às vezes fico pensando: fiquei 5 anos absolutamente sozinha, fugindo de qualquer tipo de relação, não querendo mesmo me envolver com ninguém e de repente, a vida me faz uma sacanagem dessas.Devo ter jogado pedra na Cruz... Agora mesmo é que me fechei, não há mais espaço para esse tipo de sentimento. Me disseram que o diagnóstico foi: amnésia psicogênica. Ela é provocada por um forte transtorno emocional, e o que trás dor e sofrimento, a memória bloqueia. Conclusão: fui bloqueada! O que sei é que independente de qualquer desfecho ele foi, é, e sempre será o amor da minha vida! Você entende...

            Ainda acariciando-a, falei baixinho em seu ouvido:

            -- Sandrinha, Você está sendo muito ingênua. Aí tem duas maneiras de você analisar a questão.

            Puxei o rosto dela para ficar em frente ao meu, pedi que ela olhasse em meus olhos. Aleguei que só assim ela veria minha sinceridade, falei calma e pausadamente olhando fixamente em seu olhos.

            --  Vamos racionalizar... pressupondo que seja verdade... e que o homem lá tenha um piripafe por causa de uma bobagem dessa. Bem se aconteceu isso o cara já tinha algum problema de emocional. Talvez ele tenha um transtorno de borderline...

            -- Borde o quê?

            -- Boederline...

            -- Ah! Rick! Você está inventando isso... Sou mulher e sei quando um homem só quer dar uma fodinha porque brigou com a mulher...

            Segurei ela pelo queixo, não queria deixar que ela fugisse do assunto. Então confessei,

            -- Sim. Não vou negar que você me atraiu muito. Não vou negar que quero sim fazer amor com você, mas não tem nada a ver com eu ter resolvido me separar hoje, e o destino me brindar por tê-la conhecido... mas falo a verdade. Existe o transtorno de bordeline... não é invenção minha.

            Tentando virar o rosto ela falou,

            -- Nem era em mim que você estava interessado, era em Adelaide, mas se você não sabe é a Ana que gostou de você. Se você der em cima dela você vai conseguir sua diversão, eu sou diferente, não gosto de ser objeto de uso...

            Eu interrompi a conversa de modo abrupto e ainda segurando-a pelo queixo  disse,

            -- Tudo bem. Ficarei com Ana se isso lhe agrada. Mas deixe-me falar...

            O Garçom apareceu com as bebidas e ao ver que eu segurava o queixo de Sandra perguntou a ela se eu estava saindo da linha. Soltei o queixo dela e ela olhando para o garçom disse, não. É um amigo. Olhei feio para o garçom, um homem forte, mas até ao envolver-se ele foi educado. Perguntou se queríamos mais algum tira-gosto. Disse se tiver me traga um fila ao palito. Sandra perguntou se podia pedi batata frita. Eu disse ao garçom, traga-me também uma porção de batata frita. E pela demora já traga junto mais dois drinks. O garçom saiu. Sandra para meu espanto permaneceu com o rosto a um palmo do meu. Agora eu só me preocupava em provar que eu não mentira, e tentei explicar,

            -- O transtorno de bordeline é caracterizado por ciúmes, raiva, possessividade e impulsividade bem acima do normal. É muito típico do homem que tem esse transtorno atrair as mulheres mais carentes e românticas, é fácil ser conquistada por quem tem esse transtorno porque os primeiros contatos são maravilhosos. Vocês adoram a falta de cerimônia que eles têm de demonstrar os sentimentos, eles se jogam de cabeça e se mostram extremamente afetivo. É um amor jogado a seus pés, e isso fascina qualquer uma mulher romântica.. Porém com qualquer decepção seja ela real ou imaginária, eles se tornam patológicos porque costumam lidar muito mal com a rejeição, a desaprovação e o abandono. Sentem ciúmes descontrolados, paranoia e apresentam grande instabilidade emocional por ficarem dependentes afetivamente. E foi, como você me contou, como seu Português agiu. Se for esse o caso, levante os braços e dê graças a Deus por ele ter tido amnésia. Conto isso porque um amigo meu foi morto por um sujeito que tinha este transtorno. Ele simplesmente não aceitou o fim do relacionamento e não deixava sua ex-namorada se relacionar com mais ninguém. Ou, então seu Português é um grande sacana e esteja brincando com você. Você na verdade não sabe se quem entra em contato com você é mesmo a filha dele. Na verdade você não sabe nada sobre ele, ele apenas criou uma personagem, e provavelmente teria que vir mesmo ao Brasil e apenas a usou. E agora está jogando esta culpa em você por pura sacanagem... Eu vou dizer e é verdade, que a princípio me atrai por sua amiga. A loira, como é mesmo o nome dela...

            -- Adelaide.

            -- Isso, Adelaide. Ela linda, na verdade todas vocês são lindas. Mas hoje é carnaval, eu resolvi que sou livre, e que não vou voltar mais para casa... Cansei de me comportar como um fantoche nas mãos de uma mulher que só demonstra interesse pelo dinheiro que ganhei as custas de muito estudo, talento e principalmente trabalho...

            Enquanto falava Sandra se deixara aproximar e estando a menos de meio palmo de meu rosto eu segurei em sua nuca e a beijei... Ela correspondeu ao beijo. O garçom já havia posto os tira-gostos e os drinks na mesa sem que eu houvesse percebido. Entre carinhos, tira-gostos e drinks ficamos namorando sem perceber o tempo passar. Beijávamos quando as outras meninas chegaram e fazendo estardalhaço brincavam nos empurram do e dizendo em couro,

            -- Tão namorando, tão namorando.

            Meio sem graça, perguntei vamos ao camarote? Ana Clara olhando para Sandra disse,

            -- Me passou a perna, em moleca.

            Sandra me dando um leve empurrão respondeu,

            -- Pode ficar! É seu.

            Ana Clara sentou em meu colo, mas Sandra, rindo, a empurrou e disse:

            -- É meu e ninguém tasca!

            Perguntei,

            -- O que vocês querem beber?

            Adelaide perguntou,

            -- Pode ser champagne?

            -- O que vocês quiserem, mas vocês não me responderam, já está anoitecendo, ainda tenho que alugar um carro ou uma vã...

            Mayara, a mais calada que respondeu.

            -- A gente faz o carnaval aqui mesmo.

            Respondi,

            -- Que seja! Ficamos aqui. Peçam o que quiserem.

            Perguntei em quais quartos elas estavam e fui ao balcão do hotel e me registrei num quarto ao lado de um dos das meninas. No balcão, o jovem atendente me perguntou pelas malas. Disse-lhe que ficaria até sábado, que ele poderia cobrar as diárias antecipadamente. Ele estranhou e convocou o gerente que aprovou de imediato. Assinei a papeleta e voltei ao bar. Ouvi, mas fingi que não ouvira, Mayara falar no ouvido da Sandra. Não vá se apaixonar de novo... ele é casado. Ana me abraçou e disse,

            -- Trouxe o Viagra? Essa aí, tá sem uso faz tanto tempo que está igual a virgem. Lembrei que não tinha camisinha. Chamei o garçom, dei uma nota de cinquenta e perguntei se ele poderia providenciar. Ele devolveu a nota e disse ter sobre o frigobar. Insisti dele ficar com o dinheiro, ele agradeceu. Não demorou, e só restamos no bar do hotel eu e as meninas. E atendendo a pedido o barman colocou músicas de carnaval no som ambiente. Fechava o bar quando subimos e fomos todos para o meu quarto. Lá foi uma festa. Por intermédio do telefone alguém no hotel conseguiu uma passagem aérea para o Rio de janeiro. Dormi com a Sandra.

        No sábado parti, ainda de pijama e tênis, com elas para o Rio de Janeiro. Fui sem sombra de dúvida a atração principal do aeroporto Luiz Eduardo Magalhães, para mim, ainda Aeroporto Dois de Julho, referencia maior da liberdade brasileira. Eu e Sandra ficamos no pequeno apartamento dela, uma quitinete em Botafogo. Namoramos bastante. No domingo, após comprar uma bermuda de camelô, fomos à praia, à tarde fomos as Shopping onde fiz compras e fui ao cinema, não necessariamente nessa ordem. Na segunda já sabia que desfilaria na Unidos de vila Isabel e desfilei, meio que sem jeito, ao lado das passistas. Na terça pela manhã recebi um telefonema da Ana Clara, eufórica, para me contar que, estampado no Facebook, uma foto minha brilhava ao lado de uma passista em pleno Sambódromo.     

         

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