Homenagem de Guido Guerra.
Custa-me escrever sobre Ariovaldo Matos, emocionalmente envolvido com ele desde meus começos. Eu o conheci, há muitos anos , numa redação de jornal , em que, misturando modéstia com porretismo, era o redator principal e mais que isto até: a coragem em letra de forma.
Afeito a muitos apressei-me a elegê-lo
entre os meus mais queridos. Lembro-o, às vezes, vário e único. Outras vezes
não poucas, quase cavalheiro solitário do grito não permitido e portavoz das
verdades não consentidas.
Foi, contudo, na cadeia, onde mais o admirei. Não pela
coragem chegar à temeridade, mas pelo silêncio que se impôs: o sofrimento mudo,
de que era, como continua sendo, amigo íntimo, perfeito, no que, como quê ampliado,
cresceu a meus olhos e legou, ao menino rebelde que eu era, o exemplo.
Diante da máquina, emocionado,
escrevo sobre ele, no desesperado esforço pela contensão. Revejo-o de tantas
maneiras e em muitos lugares. Ora na euforia mais estabanada, ora no seu quase
silêncio de homem monossilábico.
Dele, aqui ou em qualquer parte muito
sei. Desde a revolta dura à gargalhada solta. Da ternura do abraço mais
solidário ao soco das palavras mais ásperas. Da indignação ante o empastelado à
irreprimível lágrima diante do amigo morto.
Ele sempre me lembra seu próprio
personagem: preso, a cara arrebentada , mais que capaz de sorrir, e, também, de
dizer:
— Inteiro, irmão, intato.
O deputado aproxima-se .
— Inteiro como? — pergunta — Você
está todo quebrado.
Ele sorri:
— Não falo do corpo. Falo da
consciência e da honra.
O Deputado olha-o detidamente. Ele
completa.
— Este ritus, na face, é um sorriso.
Guido Guerra.
Desenho da ilustração: Ricardo Matos
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