Por favor, não me ame não...
É muita responsabilidade para minhas costas estreitas. Se há uma sentença que me mete medo é esta: “eu te amo”. É verdade! Eu iria escrever: “se há uma ‘frase’ que me mete medo”, contudo, preferi usar o termo ‘sentença’. Porque é uma sentença, um castigo, uma chaga ser amado por alguém nestes termos da normalidade social humana. Quando alguém diz que me ama, na grande maioria das vezes, eu me sinto obrigado a retribuir, a ter que arranjar tempo para quem me estigmatizou como um ente amado. Passo a ter obrigação de ser como a pessoa imaginou que eu seja. Passo a ter obrigação de corresponder às expectativas criadas por elas, as que me amam.
E, como cada uma delas criam expectativas diferentes, quando somadas, estas expectativas tornam-se tanto maior quanto o número de pessoas que me amam, e por via de consequência, maior é a cruz a ser carregada nesse calvário.
A primeira coisa que acontece com a pessoa que passa a me amar é exigir que eu também a ame, e por amá-la, quer que eu busque ter bons hábitos ou hábitos que ela julga bom, já que minha morte ou doença lhe causará sofrimento. Então terei que parar de fumar, de beber, de comer carne, de trepar sem camisinha e mais todas essas coisas criadas pela mídia, via médicos, jornalistas e picaretas, que querem faturar em minhas costas, que querem que eu venha ser um eterno e velho decrépito. Como se a morte não fosse uma benção depois de certa idade.
As pessoas que me amam, por me amarem, começam a se achar no direito de se envolverem em minha vida, começam a ter ciúmes sociais de mim e a culpa, do ciúme, delas, por mais louco que pareça, passa a ser minha.
Elas perdem a alegria de viver, por me amarem, ao descobrirem que eu só sou fiel a mim mesmo e a minha razão, e cobram de mim uma fidelidade, (não falo só de sexo, que fique claro), como se eu houvesse pedido a elas para que elas me amassem. Não sabem elas que eu só sou fiel a mim mesmo. E só sou fiel a mim mesmo porque é de minha natureza.
Nunca vi ninguém odiar a quem ela é indiferente ou a quem sente apenas um leve afeto. Têm muito mais. As pessoas que me amam passam a se preocupar com o que pensam de mim, pessoas que eu nem conheço e que cago-e-ando em saber se estão vivas ou mortas. E começam a querer me escravizar aos ideais sócias destes indivíduos, para mim, completos estranhos, zumbis sociais.
Vou dar um exemplo: se eu saio de pijama para jogar o lixo fora porque o odor lixo me incomodou, é certo que alguém que nunca percebi sequer a existência, irá contar a uma ou mais pessoas que me amam que eu ando na rua de pijama. A pessoa que me ama, antes mesmo de almoçar, telefonará para saber do ocorrido e tentará me imputar uma culpa que eu não quero sentir, ou pior, se for uma dramática já marcará um psicólogo ou um psiquiatra e tentará me obrigar a ir à consulta. E, porque ela me ama, ela se acha nesse direito. E se eu sugerir que ela “vá tomar no olho do chico”, pronto! Eu serei um ingrato. Tornar-me-ei um ser não merecedor do mais belo dos sentimentos, o amor. Tonar-me-ei um psicopata e, é bem capaz de aparecerem dois enfermeiros para me segurarem e um estagiário de medicina para me aplicar um “amansa-leão”. Assim, quando eu acordar numa camisa de força dentro de um hospício, porque eu fui jogar o lixo fora de pijama, terei que lembrar que a pessoa que mandou me internar, só o fez porque me ama. Por isso senhoras e senhores, peço, encarecidamente, que não me amem... No máximo tenham um leve afeto por mim. Ou então aceitem o desprazer de amar um mentecapto, um louco. Agora me deixa ir jogar o lixo fora porque o odor está me incomodando.
PS: Moro bastante longe dos que me amam. Foi à forma mais inteligente que achei de não magoá-los por só sei me aceitar ser como sou. Aqui perto, só mora mesmo minha mana, mas ela não está nem aí para minhas maluquices... Creio que já se acostumou e já deve ter sugerido a vários zumbis sociais, que foram mitigar em seus ouvidos, que eu sou assim mesmo e não existe jeito a se dar.
Ricardo Matos
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